General Note
Esta célebre cantiga de Martim Soares alude a um dos casos que mais brado deu na sua época, como a sua rubrica, aliás, indica: o rapto (e posterior casamento) de D. Elvira Anes da Maia, neta do Conde D. Mem Gonçalves de Sousa, o Sousão (valido de D. Sancho I e a principal figura da nobreza do seu tempo), por Rui Gomes de Briteiros (também trovador). À época um simples infanção, de origens modestas, com este casamento Rui Gomes inicia um percurso de ascensão social que o transformará gradualmente numa das figuras mais influentes do reino. Composta em forma de maldizer aposto, note-se que é a própria voz de Rui Gomes que ouvimos na cantiga, gabando-se da impunidade do seu ato.Não sabemos exatamente de quando datará a composição de Martim Soares, mas certamente ela não será muito posterior ao dito rapto, que se terá dado por volta de 1230 (e que poderá ter sido, aliás, mais ou menos consentido). De qualquer forma, e para além do próprio rapto em si, poderemos dizer que o ponto de vista de Martim Soares, acentuando sobretudo a passividade dos que deveriam defender a honra da família, se alarga aqui a um retrato mais geral, o da "miséria moral e a decadência da alta nobreza de sangue", nas palavras Rodrigues Lapa1.
Quanto a Rui Gomes de Briteiros, a posição que irá tomar antes e durante a guerra civil portuguesa (1245-1248), de apoio incondiconal ao Conde de Bolonha, futuro Afonso III, permitiu-lhe ser regiamente recompensado por este monarca, que o faz rico-homem e mordomo-mor do reino. Símbolo da nova nobreza emergente, será a ele e à sua linhagem, aliás, que, posteriormente, D. Afonso Lopes de Baião (casado com outra neta do Conde, D. Mor Gonçalves de Sousa) dirigirá uma conhecida gesta de maldizer.
Bibliographic references
1
Lapa, Manuel Rodrigues
(1970),
Cantigas d'Escarnho e de Maldizer dos Cancioneiros Medievais Galego-Portugueses, 2ª Edição,
Vigo, Editorial Galaxia