General Note
Com uma notável musicalidade, esta cantiga satiriza o que parece ser a ascensão fulgurante de um pobretanas manhoso ao cargo de comendador de Uclês, ou seja, ao importante posto de Mestre da Ordem Militar de Santiago para a província de Castela.De facto, como sugeriram Elisa Priegue3 e Ana Freixas1, é possível que este alegado pobretanas aqui referido não seja outro senão o célebre D. Paio Peres Correia, poderoso cavaleiro português que foi sucessivamente Mestre provincial do Alentejo (e principal artífice da sua reconquista - sendo, por isso, citado n'Os Lusíadas), Mestre provincial de Castela em 1241, e, finalmente, Grão-Mestre da Ordem de Santiago durante largos anos (1242-75). Para além do que se sabe ter sido o caráter conflituoso e irrascível de D. Paio Peres Correia, que certamente lhe criaria inimigos, mesmo no interior da Ordem, é possível que este ataque do também português Pero Mendes da Fonseca se insira num cenário concreto de conflitos políticos, provavelmente relacionados com a revolta nobiliárquica contra Afonso X, conflitos esses que se prolongariam entre os portugueses presentes na corte castelhana, onde a composição terá sido composta. Na verdade, as boas relações de D. Paio Peres com o monarca (e que já vinham do reinado anterior de Fernando III) parecem ter-se deteriorado acentuadamente por volta de 1272, em razão do alegado apoio que o Mestre de Santiago terá dado aos revoltosos (Gonzalez Jimenez2, que cita uma carta do rei a seu filho D. Fernando, expondo as acusações). A cantiga datará, pois, eventualmente dessa época, marcando o apoio de Pero Mendes da Fonseca às posições do rei.
Note-se a curiosa referência inicial a uma personagem dos contos populares portugueses, também identificada com o Diabo4, o "Paio das más artes" (no que será também uma referência equívoca ao nome do satirizado).
Bibliographic references
1
2
González Jiménez, Manuel
(1999),
Alfonso X,
Burgos, Editorial La Olmeda, 2ª Ed.
3
Ferreira Priegue, Elisa
(1978),
“Chegou Paio das maas artes…(CNB1600 = CV 1132)”, Cuadernos de Estudios Gallegos, XXXI,
4
Tato Fontaína, Laura
(2007),
O Cancioneiro de Pero Meendiz da Fonseca,
Santiago de Compostela, Xunta de Galicia, Centro Ramón Piñeiro