Nota geral
Da extensa rubrica transcrita no final desta pequena cantiga retenhamos, antes de mais, que se trata de uma cantiga de seguir. Ou seja, João de Gaia utilizou (seguiu) aqui certamente a música e, como é referido nessa rubrica, o refrão de uma cantiga de vilão (citada de forma mais completa na rubrica que antecede a composição). A rubrica mais extensa explica-nos ainda o contexto em que o fez: tratava-se de ridicularizar um ex-vilão, alfaiate de profissão, feito cavaleiro por D. Dinis, a pedido do seu protetor, o bispo de Lisboa. Entenda-se assim toda a ironia da pequena cantiga, feita em "honra" do antigo alfaiate: como mandavam as regras deste tipo de cantiga de seguir, o refrão devia tomar outro sentido em contato com estrofes diferentes. É o que se passa exatamente aqui: as expressões em cós e cavaleiro, que na cantiga original aludiriam a uma qualquer cena de sedução feminina, passam a aludir, respetivamente, ao antigo ofício (alfaiate) e ao novo estatuto do visado (cavaleiro). Também o facto de João de Gaia seguir uma cantiga de vilão não é inocente.Acrescente-se que, se bem que objeto de um parágrafo na Arte de Trovar (cap. VIII), esta é, aliás, a única referência explícita a este tipo de cantigas nos cancioneiros, cantigas estas cujos contornos permanecem indefinidos, mas que, como o seu nome indica, teriam certamente um cariz popular.