Nota geral
Esta célebre pastorela de João Airas é, seguramente, um dos mais belos exemplos da arte dos trovadores. Partindo da norma usual deste género de composições (um encontro entre o trovador e uma pastora, e o subsequente diálogo entre ambos, em que o primeiro tenta seduzir a segunda), João Airas constrói, com grande sensibilidade poética e notável mestria técnica, um quadro que, sendo de locus amenus, não deixa de estar muito concretamente ancorado nas paisagens do noroeste peninsular (já que a cena se passa no "souto de Crexente", nas margens do Sar, o rio que atravessa Santiago de Compostela).Como breves linhas suplementares de leitura, o leitor poderá ter em atenção 1) na primeira parte da cantiga (correspondente às duas primeiras estrofes) o notável jogo com as aliterações na descrição de uma alvorada campestre (e um pouco fria, já que a donzela se "aperta na saia"); 2) o diálogo cortês que se processa na segunda parte (terceira e quarta estrofes), com o trovador assumindo o papel de sedutor receoso e educado, um receio que é comum à "pastora", mas, no seu caso, pelo perigo que tal encontro solitário pode significar para a sua reputação.